Conversar sobre a morte, deixar virem reflexões sobre o sentido de morrer, entregar-se aos sobressaltos de sentimentos difíceis. Respeitarei os seus silêncios durante a minha escrita. São necessários para as reflexões que eu gostaria que nascessem dentro de você.

Em alguns momentos serei direta, e minhas palavras podem ferir seus olhos. E você fechará o livro. Mas sei que voltará, e seguiremos o caminho de onde paramos, ou talvez até recuaremos uma ou duas esquinas (ou páginas). Todos nós vamos morrer um dia. Mas, durante a vida, nos preparamos para as possibilidades que ela pode proporcionar. Sonhamos com nosso futuro e vamos à luta. Sonhos tão humanos de ter uma carreira, uma família, um amor ou vários, filhos, casa própria, viagens, ser alguém na nossa vida ou na vida de alguém.

Buscamos orientação somente para as coisas mais incertas. Quem garante que vamos ter sucesso na carreira? Quem garante que encontraremos o amor da nossa vida? Quem garante que teremos filhos ou não? Quem garante? Ninguém garante nada sobre essas possibilidades. Mas a morte é garantida. Não importa quantos anos viveremos, quantos diplomas teremos, qual o tamanho da família que formaremos. Com ou sem amor, com ou sem filhos, com ou sem dinheiro, o fim de tudo, a morte, chegará.

E por que não nos preparamos? Por não conversamos abertamente sobre essa única certeza?

O medo, os preconceitos, a fragilidade que essa conversa expõe são maiores do que a nossa vontade de libertação desses temores. Há tempos na nossa vida onde as palavras não chegam. Tempos onde entramos em contato com o que há de mais profundo em nós mesmos, buscando respostas, sentidos, verdade. O tempo de morrer é um desses momentos. Rilke, em Cartas a um jovem poeta, traz aquela que é, na minha opinião, a mais sublime explicação para o que vivenciamos no final da vida.

Seja como expectadores, seja como protagonistas, a morte é um espaço onde as palavras não chegam. Tem momentos que vivi acompanhando pacientes na sua fronteira da vida que jamais poderiam ser traduzidos fielmente em palavras. O indizível é a melhor expressão da experiência de vivenciar a morte. Na vida humana, talvez somente a experiência de nascer possa ser tão intensa quanto o processo de morte. E talvez seja por isso mesmo que tememos tanto esse tempo. O mais inquietante é que todos nós passaremos por ela ou acompanharemos a morte de quem amamos.

Ana Claudia Quintana Arantes, excerto extraído do livro “A Morte é um dia que vale a pena viver”. Editora LeYa, 2016.






Viver em harmonia é possível quando abrimos o coração e a mente para empatia e o amor.