Segundo a União Europeia de Urologia, 15% dos casais afetados procuram tratamento para infertilidade e, deste número, apenas 5% continuam sem filhos. Isso se deve ao avanço a passos largos da medicina reprodutiva, que atualmente dispõe de técnicas que elevam consideravelmente as chances de um casal gerar um filho.
As técnicas de fecundação assistida evoluíram muito desde o nascimento do bebê Louise, o primeiro bebê de proveta, em 1978. Há menos de duas décadas, a taxa de sucesso da fertilização in vitro (técnica de reprodução assistida mais complexa e eficaz), era de, aproximadamente, 30%.
Atualmente, as clínicas brasileiras trabalham com uma taxa de 40% a 45%. Atrelados a isso, está uma grande diversidade de fatores. Um deles é o alto grau de conhecimento e preparo dos profissionais — que não se limita ao médico. Os equipamentos e a competência dos profissionais são essenciais para tentar atingir o objetivo da gravidez por meio das técnicas de fertilização. Daí a importância de casais procurarem por clínicas de referência.
Aumento do número de gêmeos
O sucesso da reprodução assistida não é medido apenas pela porcentagem de nascimentos, mas também pela possibilidade de congelar, adequadamente, o embrião para implantá-lo na hora em que o útero está mais preparado.
Nos últimos anos, outro fato observado foi a quantidade de gestações múltiplas, ou seja, quando nascem gêmeos, trigêmeos ou quadrigêmeos, que caiu consideravelmente, pois os progressos permitiram implantar menos embriões no útero sem diminuir a chance de ao menos um se desenvolver.
No passado, até 50% das fertilizações in vitro bem sucedidas resultavam em ao menos dois bebês. Atualmente, esse número caiu para menos de 30%. Segundo o médico especialista em medicina reprodutiva, Daniel Diógenes, o nascimento de gêmeos duplos é aceitável, porém o ideal é o nascimento de um único filho por vez.
“O corpo da mulher é preparado para gerar apenas um filho por vez. Por mais que muitas delas sonhem em ter gêmeos, a gravidez múltipla pode colocar em risco a mãe e os bebês. Quanto maior o número de fetos, maior o risco para ambos”, explica Daniel.
Síndrome que atinge uma mulher em cada 4500
Em setembro de 2016 no Hospital das Clínicas de São Paulo, uma equipe de 14 médicos brasileiros liderados pelo ginecologista Dani Ejzenberg conquistaram um feito inédito: eles realizaram um transplante de útero a partir de uma doadora morta e a mulher que recebeu o órgão conseguiu engravidar posteriormente. Além disso, a criança nasceu saudável. “Apesar de tentativas anteriores, é a primeira vez que um procedimento desses dá certo”, conta Ejzenberg.
A paciente, de 32 anos, tinha a Síndrome de Mayer‐Rokitansky‐Kuster‐Hauser (MRKH), doença que afeta uma a cada 4 500 mulheres. O quadro é caracterizado pela falta (total ou parcial) de estruturas que compõem o aparelho reprodutor feminino. Nesse caso específico, ela não tinha o útero, o que impossibilitava qualquer gravidez.
A doadora do órgão tinha 45 anos e morreu após sofrer uma hemorragia em uma região específica entre o crânio e o cérebro. Ela havia realizado três partos anteriormente.
Parto bem sucedido
A cirurgia pioneira durou quase seis horas e foi um sucesso. A mulher teve alta após oito dias de observação no hospital e precisou tomar remédios imunossupressores durante cinco meses para evitar que seu corpo rejeitasse o útero recebido. Após 37 dias do procedimento, já ocorreu a primeira menstruação e, sete meses depois, os especialistas resolveram implantar um embrião que havia sido colhido, passado pela fertilização in vitro e congelado previamente a partir da junção de seu óvulo com o espermatozoide de seu marido.
A gestação evoluiu normalmente e o parto cesariano ocorreu no dia 15 de dezembro de 2017. Chegava ao mundo uma menina de 2,5 quilos e com o desenvolvimento esperado para a idade. Logo após o nascimento, o útero foi retirado da mulher para que ela não precisasse tomar remédios imunossupressores para o resto da vida. A recém-nascida está para completar um ano e, ainda bem, não apresenta qualquer problema de saúde. O relato completo do caso está no prestigiado periódico científico The Lancet.
Avanço da ciência brasileira
Outros trabalhos conduzidos na Suécia já haviam demonstrado que o transplante de útero dava certo. Porém, todos os casos foram feitos com órgãos de doadoras vivas. “Geralmente, a mãe doava o útero para a filha. Dos nove casos realizados no país escandinavo, sete mulheres conseguiram engravidar”, detalha Ejzenberg. Portanto, essa é a primeira vez que a tentativa de engravidar com o útero de uma doadora morta funciona — uma experiência anterior na Turquia infelizmente acabou em cinco abortos seguidos.
De acordo com os autores do artigo, o bom resultado demonstra que esse tipo de cirurgia é um caminho para tratar a infertilidade, problema que afeta até 10 a 15% dos casais que desejam ter um filho.
Num editorial da mesma edição do The Lancet, os médicos Cesar Diaz-Garcia e Antonio Pellicer, das universidades de Oxford (Inglaterra) e de Valência (Espanha), respectivamente, escreveram sobre o feito brasileiro: “Num cenário em que a escassez de informações e evidências científicas ainda são a norma, o artigo de Dani Ejzenberg e colegas representa um avanço importante no conhecimento sobre os transplantes de útero”.
Fontes: Agência Fapesp, Saúde Abril
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