Viver de literatura não é nada fácil e viver da literatura de rua tem que ser resistente, amar muito este ofício, e se virar de outras maneiras, como a maioria esmagadora de artistas.
O jeito que a escrita organizou-se no mundo sempre mudou e hoje se apresenta de um jeito completamente diferente.
Segundo Lúcia Santaella, professora titular da PUC-SP com doutoramento em Teoria Literária na PUC-SP, afirma que a web 1.0, a rede de busca de informações digitais, advindas da popularização do PC, do mercado digital.
A web 2.0, o modelo atual, das redes sociais, com o foco no usuário e na sua produção de conteúdo estão dando lugar à web 3.0; produto da inteligência artificial, que tem uma arquitetura semântica, ou seja, ao invés dos softwares de busca procurarem palavras-chaves estes procuram significados, valores, ideias de forma analítica.
Mas nestes tempos de interatividade instantânea, textos curtíssimos, emojis e gifs, ainda há espaço para publicações impressas? Acreditem, tem sim!
Na 19 ° Bienal Internacional do Livro na cidade do Rio de Janeiro, mais de 4 milhões de livros, dos 5,5 milhões de exemplares disponíveis, foram vendidos.
Um aumento de 11% em relação à última edição, em 2017, quando foram vendidos 3,6 milhões de livros em 11 dias, quanto papel não?
Mas as publicações digitais: e-books e áudio-livros vêm ganhando espaço. O consumo e a leitura estão ao alcance da palma da sua mão.
A forma de publicar mudou
Antes da globalização e da revolução digital o mercado literário concentrava-se na impressão de livros, revistas e jornais, almanaques etc. E agora com a popularização das tecnologias digitais há uma forte migração do papel para a produção em formato e-book.
Muitos dizem que os livros em formato de papel não existirão daqui a uns anos, porém, muita gente ainda os consome todos os dias.
As grandes editoras que adaptaram-se ao novo mercado editorial digital continuam na ativa enquanto a popularização dos blogs, fóruns literários nas redes sociais e plataformas de criação viabilizaram o surgimento de outras editoras independentes, como a editora Ameopoema.
A editora foi criada em 28 de Maio de 2014 por Rômulo Ferreira e tem a missão de divulgar quem produz conteúdo literário de forma independente, em especial poesia.
A editora também produz zines, livros, cadernos, camisas, livretos, tudo feito de modo artesanal.
Rômulo é poeta, escritor, editor e ilustrador. Sua primeira obra é “Color de Luna” (uma coletânea de poemas escritos entre 2005 e 2009), que fala sobre amor e saudade.
Seu segundo livro chama-se “Boa Noite Meretriz”, lançado em janeiro de 2010, “Olhares e Silêncio” em junho e “Amorfo” também no mesmo ano de 2010.
Vamos ver o que Rômulo nos diz:
Ecos da paz: A editora ainda organiza os Saraus na Cinelândia na cidade do Rio de Janeiro ou está concentrada mais em MG ?
Então, a série de saraus rolava mais quando eu morava no RJ, parece que o pessoal meio que desanima de puxar, aí eu colocava pilha em todo mundo. Depois que eu vim morar em Ouro Preto, MG, o sarau na Cinelândia meio que deu uma pausa…
Com a minha ida ao RJ no começo do ano (2020) fizemos um sarauzinho, coisa bem simples, ficou restrita ao pessoal do grupo do facebook. Trocamos umas ideias, materiais, bebemos umas cervejas e mandamos uns poemas.
A editora AMEOPOEMA está mais focada nos trabalhos aqui em Ouro Preto, principalmente na “Mostra Grampo” e nas publicações do coletivo, mas nada impede de rolar o sarau em qualquer lugar do mundo, é uma coisa que acontece, é só alguém puxar e sapecar.
Ecos da Paz: “O poeta aponta a Lua, o imbecil olha o dedo” é um blog que tem a referência do seu primeiro livro “Color de Luna”?
Esse é um blog muito antigo meu e ficou como uma forma de arquivar meus textos mais antigos, e ruins hehehe… Ele deve ter uns 20 anos no ar, mas perdi a senha deste blog e tive que criar outro.
Essa frase é meio um ditado, é um lance dos chineses, aparece no filme da Amelie Poulain. Eu fazia uns lambe-lambe aqui em MG no começo dos anos 2000 e sempre colocava essa frase. Se for pensar bem a frase é um “tapão” na cara, né?
Ecos da Paz: Muita gente ficava nas portas do CCBB-RJ vendendo seus exemplares de zines, você acompanhou a cena de perto?
Não só acompanhei como fiz parte. Era um negócio, nos dois sentidos: ir lá, encontrar o pessoal que estava na mesma onda, vender uns zines, trocar ideias sobre produção, sobre a vida, criamos laços de amizades e uns ranços também. Às vezes o CCBB implicava e o seu público era meio metido a besta. Diziam que eu tinha que aprender a fazer arte, que calçada não dava futuro.
Eu gostava mais da Cinelândia, achava a praça mais charmosa e apta a poesia. Bom, mas, tretas à parte, o CCBB era massa, lá tem uma biblioteca com uns livros muito bons, soube que era umas maiores bibliotecas com livros de arte do Brasil.
Te confesso que já fiz muita grana lá naquela porta, vendi não sei quantos mil fanzines lá. Fiquei até meados de 2015, depois acho que entrou uma galera nada a ver com o lance dos fanzines. Aí eu fui pra outros lados da cidade, na zona oeste, na Barra da Tijuca, Recreio.
Ecos da Paz: Em tempos de extrema digitalização quais saídas a editora encontra pra sobreviver de maneira independente?
Eu gosto do papel e tem muita gente que gosta. A nossa geração ainda tem a memória voltada pra mídia impressa, ao toque no papel. O fazer manual é lindo, atraente, e tem um valor danado.
É uma luta, temos que nos virar de qualquer modo né? Eu tenho conseguido aliar o lado digital com o papel, com o impresso e acho que quando o trabalho é maneiro não existe barreira.
Eu tenho um parêntese a fazer: a circulação na rede social dura pouco, meus livros por exemplo, mandei para muita gente e tive pouco retorno da leitura, as pessoas acabam se envolvendo com outras coisas e perdem o foco.
Ecos da Paz: Fale mais sobre os outros projetos
Eu tenho um projeto de pesquisa que trata de fanzines em sala de aula na rede pública de ensino de Ouro Preto e tenho produzido bastante material .
O Suplemento Acre é uma revista coletiva que recebe material de todo tipo. O fanzine Silhueta, é um projeto mais autoral, que existe desde julho de 2005, é onde dou vazão aos meus poemas e ilustrações.
Como tenho a editora AMEOPOEMA, acaba que a uso como suporte para divulgá-lo e assim tentar ampliar o seu alcance.
O mesmo rola com o Suplemento Acre, esse já tem mais ligação com a editora é um material que nasceu para publicar a galera do nosso grupo no facebook, de forma livre e sem muitas regras.
A revista está indo para o seu oitavo ano e sempre com gente nova a cada edição. A revista é um produto totalmente artesanal, desde a capa até a montagem.
Não posso esquecer do fanzine AMEPOEMA, que fez isso tudo girar. Esse fanzine fará 10 anos de vida agora em junho. Ele nasceu de uma vinda minha a Belo Horizonte, onde eu ia dar uma palestra sobre poesia e sobre fanzines, lançar um livro e me divertir com os amigos da terrinha onde nasci…
Tive esta ideia em conjunto com a minha companheira Bárbara e na quarta edição ampliamos, pois, a procura por parte de autores em ser publicado nele era bem grande.
Já a Mostra Grampo é um baita evento voltado para o mundo dos fanzines e afins, das publicações independentes. Está indo para sua edição 06, e desde o ano 2018 rola aqui em Ouro Preto, e já virou evento da cidade, onde recebemos apoio massivo da população e de vários artistas locais.
Ecos da Paz: Tem algum interesse em vincular-se a alguma plataforma digital de publicação além das redes sociais?
Eu tenho interesse em tudo. Se não fosse a internet eu não conheceria metade das pessoas que hoje convivo através da poesia.
A coisa está aí para ajudar, a gente tem que se educar para um bom uso e saudável.