Sociedade e cidadania

Antonieta de Barros, a filha de uma ex-escravizada que se tornou a primeira deputada negra em Santa Catarina

Ela nasceu em 11 de julho de 1901, a Abolição era recente e neste período muitos dos negros libertos conquistaram postos na vida pública. Muitos quebraram paradigmas numa sociedade branca e burguesa e Antonieta foi uma delas.

Hoje seu nome está no auditório da Assembleia estadual de Santa Catarina, bem como na comenda oferecida pela Câmara Municipal de Florianópolis.

O começo desta história incrível teve a participação marcante da sua mãe, Dona Catarina, uma escrava liberta que trabalhou como doméstica na casa do político Vidal Ramos, pai de Nereu Ramos, que viria a ser vice-presidente do Senado e chegou a assumir por dois meses a Presidência da República.

Foi graças ao esforço da mãe que Antonieta e sua irmã Leonor conseguiram concluir o curso normal, de formação para professoras.

Aos cinco anos ela foi alfabetizada numa escola particular e dois anos mais tarde entrou no curso primário. Porém, não teve como prosseguir de imediato os estudos, conseguindo ingressar na Escola Normal apenas aos dezessete anos.

Foi ali que despertou a vontade de ser educadora e, antes mesmo de concluir o magistério, já mantinha um curso primário de alfabetização, que tinha o seu nome: “Curso Particular Antonieta de Barros” (oficializado em 1922 e funcionou até 1964).

A jornalista

Sua atuação não se restringiu ao magistério, Antonieta foi também jornalista e militante política da educação. Em seus artigos, mostrava-se preocupada em formar uma cultura pacifista, via necessidade de uma campanha nacional pela alfabetização levando em consideração as diferenças sociais e os papéis sexuais.

Em uma publicação no Jornal República, Antonieta defende o acesso das mulheres ao ensino superior:

“Não se pode negar, Santa Catarina tem progredido quanto ao ensino superior. […] Há, contudo, uma grande lacuna na matéria de ensino: a falta dum ginásio, onde a Mulher possa conquistar os preparatórios, bilhete de ingresso para os estudos superiores. O elemento feminino vê, assim, fechados diante de si, todos os grandes horizontes. […] O máximo de ilustração oficial, proporcionado às mulheres em Santa Catarina, está restrito a um curso de normalistas e nada mais. (12/07/1932).”

Como cronista, esteve presente em periódicos da capital, chegando a fundar e dirigir os jornais A Semana (1922-1927) e Vida Ilhoa (1930), assinava as crônicas com o nome de Maria da Ilha.

Seus artigos publicados no jornal República foram reunidos e editados em 1937 no volume Farrapos de Ideias. Além dos jornais citados, publicou também em Folha Acadêmica, O Idealista, Correio do Estado e O Estado.

Antonieta de Barros deixou uma considerável produção escrita e sempre optou pela imprensa como forma de atingir um número cada vez maior de leitores. Em sua obra há aspectos da vida cotidiana da cidade, comentários sobre ocorrências nacionais e, principalmente, ensinamentos de cunho moral.

Tinha a convicção idelista de que o mundo poderia se regenerar através da educação formal.

Vida política

Antonieta começou sua carreira política no primeiro governo provisório de Getúlio (1930 a 1934) participando ativamente dos debates sobre o voto feminino.
Com a nova constituição de 34 é concedido o direito de votar à toda população, incluindo mulheres, população negra e analfabetos. Além disso foi implementado o voto secreto, que não existia na época.

Este ato de Getúlio era pra conquistar de vez o apoio popular e dos movimentos sociais, afinal o gaúcho estava entrando num terreno dominado por paulistas e mineiros da velha política café com leite, a alternância de poder entre estes dois estados.

Para época, Antonieta conseguiu o inimaginável: foi eleita com mais de 30 mil votos pelo Partido Liberal Catarinense (PLC). Sua campanha trazia os seguintes dizeres: “Eleitora. Tens em Antonieta de Barros a nossa candidata, o símbolo das mulheres catarinenses, queiram ou não os aristocratas de ontem”. Este foi o anúncio publicado pelo partido no jornal “Correio do Estado”.

Em seu mandato fez a restruturação da escola profissional feminina e elaborou a lei que dá bolsas de estudos para cursos superiores e técnicos.

Enquanto deputada não abandonou seus artigos em que criticava o governo de Irineu Bornhausen, que permitia o acesso à educação até certo ponto para as mulheres e para as classes menos favorecidas. A alfabetização bastava.

Tais críticas a tornou alvo de injúrias e termos pejorativos e racistas. Em resposta ao insulto de Oswaldo Rodrigues Cabral, que disse que o trabalho de Antonieta nos jornais era uma “intriga de senzala”, ela respondeu:

[…] Não é do nosso feitio essa modalidade de comportamento. Somos leais. Leal e agradecida. Sempre fomos. E é um característico dos negros. Fizemos do Magistério o nosso caminho, e agimos sempre respeitando a professora que não morreu em nós, ainda, graças a Deus. Como, pois, a intriga? Compreendemos que a delicada sensibilidade do nobre Deputado tenha sofrido diante daquela frase. Sua Excelência, para a felicidade de todos quantos são arianos – apesar de portador de um diploma de jornalista – não milita no ensino público. Dizemos felicidade porque, à sua Excelência, falta uma das qualidades de professor: não distinguir raças, nem castas, nem classes… (O Estado, 06/05/1951).

Ao compararmos os números da época de Antonieta com os de hoje, percebemos que tivemos uma pequena melhora, vamos aos números.
Apesar das mulheres representarem 51% do eleitorado no Brasil do século 21, elas ocupam menos de 10% no congresso nacional.

Em 2018, das 513 vagas, apenas 77 são ocupadas por mulheres. E nas cidades, para cada 7 vereadores, temos 1 vereadora. Dos 190 países, o Brasil ocupa a 152ª posição com relação a participação das mulheres na política.

Em 2009 foi criada uma lei que exigia que 30% de candidaturas femininas por partido, mas que é facilmente burlada com a contratação de candidatas fantasmas .

Antonieta de Barros morreu em 28 de março de 1952, vítima da diabetes e até o final da vida alimentou o sonho de construir um Brasil mais igualitário, com educação e trabalho para todos.

Fontes: UFMG , Geledes

Revista Ecos da Paz

Viver em harmonia é possível quando abrimos o coração e a mente para empatia e o amor.

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