O beijo pode ser consentido ou roubado; cerimonioso ou ousado; inocente ou sedutor. O fato é que ele desperta as mais variadas emoções: desde a raiva até a paixão.

Ele sacramenta as relações e deixa nos lábios os mais variados gostos, um cardápio amplo, que depende do momento. É a sedução que começa na boca, e se espalha pelo corpo.

Venha se inspirar nesta crônica de Fabrício Carpinejar. Boa leitura e beije muito!

O GOSTO DO AMOR

Pode-se gostar de uma mulher, mas o beijo, não há como despistar o beijo. Enganar o beijo. O beijo diz se devemos ficar ou não. O jeito do beijo. O temperamento do beijo. O caráter do beijo.

Não se mente o beijo. É como se não houvesse um degrau: é um sopro circulado, uma neblina desenhada, a respiração voltando.
Não é o beijo com medo. É o beijo que me faz beijar de um único jeito. Com o beijo dela. É ela que beija o meu beijo.

Não há mudança de beijo, é um só beijo, que não se interrompe mesmo com a voz ou com o silêncio. É um beijo vírgula do beijo. Um beijo possessivo que anda. Um beijo que não engole.

Um beijo que cede espaço para a mão. Um beijo gentil, não menos apaixonado. Um beijo que deixa a língua ser língua, o dente ser dente, que não cala. Um beijo que fala enquanto beija.

Um beijo que não lava, que leva, um beijo que protege para se expor. Um beijo que é decidido, não arrogante. Não um beijo que conduz, um beijo que informa.

Não o beijo solitário, o beijo viúvo, o beijo desquitado. Não o beijo de provocação, o beijo carente, que poderia ser feito sozinho.

Há beijo que é mais boca do que beijo, um beijo que é mais escova do que esponja, mais pausa do que pouso.

Sei pelo beijo que não volto. Não volto quando é um beijo de quem não chupa, um beijo de quem realmente não foi beijada mesmo beijando, não foi sinceramente beijada, não fechou os olhos pelo beijo, não imaginou o próximo beijo beijando o primeiro beijo.

Não volto quando é um beijo imitando o beijo, simulando o beijo, ensaiando o beijo.
O beijo é a vontade da perna quando o braço cansa, é a vontade da cintura no pescoço. Meu beijo, um beijo que nunca completa a saudade.

Há beijo que boceja no beijo, beijo que lê no beijo, beijo que não beija porque lambe ou sussurra, porque morde ou varre, preocupado em ser outra coisa que não o beijo.

Não gosto do beijo que vai colando selos. Sem língua. Um beijo de afogado. Um beijo sem personalidade, que logo separa o corpo, porque é mais corpo do que beijo.

Se um não está apaixonado, o beijo é uma boca sem ritmo. Uma boca sem repetição. Uma boca sem vizinho, sem ouvido, uma boca acenando porque se esqueceu de seguir.

O beijo é viciado. O beijo não quer ser nada mais do que beijo. O beijo é trocar o parágrafo, não trocar de texto.

O beijo me chama antes do nome. O beijo avança os seios dela. O beijo quase me atrapalha. O beijo vento de seu beijo.

Mas não adianta procurar o beijo que você ama em outra mulher. O gosto do beijo não é o gosto da boca. O gosto do beijo é o gosto do amor.

Fabrício Carpinejar, crônica “O gosto do amor” do livro “Para onde vai o amor?”, Bertrand Brasil, Rio de Janeiro, 2015

 






Viver em harmonia é possível quando abrimos o coração e a mente para empatia e o amor.